segunda-feira, 30 de julho de 2012

Santos Manuel, O Ensaio de um Sonho e A Grande Magia

Santos Manuel, Manuela de Freitas e Mário Viegas, 
em ensaios da peça "O Ensaio de um Sonho".
Foto copiada do programa da peça "O Ensaio de um Sonho".



"Os actores são meninos a brincar no jardim 
dos deuses, para animarem os homens"
Fernando Amado


Estava ontem a terminar um post e já a pensar neste, e lembrei-me do Santos Manuel e de um episódio que revela bem o distraído que era fora dos palcos, e fiquei pensando se escreveria aqui o que se passou. E, hoje compro o jornal e dou com a noticia da sua morte. Embora não privasse com o Santos Manuel, achava que era uma pessoa tímida e discreta (como eu aprecio), e de quem eu gostava muito e sinto bastante a sua morte, mas fica a memória dos tempos que trabalhamos juntos.


Santos Manuel e Mário Viegas em 1993, na peça "Enquanto 
se está à espera de Godot" na Companhia Teatral do Chiado.
Foto encontrada em lauroantonioapresenta.blogspot.pt


A historia foi a seguinte: eu namorava já há uns meses com uma actriz, quando o Santos Manuel virou-se para o Mário Viegas e diz-lhe; «Tenho a impressão que qualquer dia vamos ter um caso do Chico com a “Maria”. E responde o Mário; «Ó Santos, então tu não sabes que eles já vivem juntos.», e ele; «Não tinha dado por nada».
Em Março de 1994, o Mário mandou recado para mim, mais uma vez através da Manuela de Freitas. O Mário mandou-me chamar e pediu-me para dar um jeito nas luzes (era para parecer luzes de um ensaio) para a peça “O Ensaio de Um Sonho”, que ele estava a ensaiar com a Manuela, o Santos Manuel e com os outros actores da companhia e era a maneira de ele me dizer que queria que eu voltasse a trabalhar com ele e assim foi, voltei e fiquei com ele até ao fim.


O Ensaio de Um Sonho (1994)
A partir de textos de
de August Strindberg e Ingmar Bergman
Encenação de Mário Viegas


Manuela de Freitas, Mário Viegas e Santos Manuel, 
os actores principais de "O Ensaio de um Sonho". 
 Foto copiada do programa da peça "O Ensaio de um Sonho". 


 Capa do programa e ficha técnica e artística. 


Critica de Carlos Porto no Jornal de Letras e de Rosário Anselmo na Visão. 


Anúncio de sessões de poesia organizadas pelo Mário Viegas. 



A Grande Magia
de Eduardo de Filippo (1994)
Encenação de Mário Viegas


Manuela de Freitas e Mário Viegas. 1994.


Manuela Cassola, Rita Lello, Manuela de Freitas e Eduardo Firmo. 1994.


Rita Lello, Manuela de Freitas, Santos Manuel e Mário Viegas. 1994.


  Capa do programa e ficha técnica e artística. 


A Grande Magia, destaque no jornal Se7e. 1994. 


Critica de Carlos Porto no Jornal de Letras e de Rosário Anselmo na Visão.  


 Mário Viegas e Santos Manuel em A Grande Magia.
Foto copiada da Visão. 1994. 


Mário Viegas e Rita Lello, num restaurante perto da Trindade. 1994.


Desenho de Mário Alberto, feito em 1994, depois de ter ido ver a peça; A Grande Magia. Uns dias depois, ofereceu o desenho ao Mário Viegas, (que por sua vez mo ofereceu) e que um dia irá para o Museu do Teatro.



DEPOIMENTO DO ACTOR SANTOS MANUEL, ESCRITO PARA O ESPECTÁCULO, “O ENSAIO DE UM SONHO”, BASEADO EM TEXTOS DE INGMAR BERGMAN E AUGUST STRINDBERG EM MARÇO DE 1994.

Em 1961 entrei para a Casa da Comédia. Lá encontrei o Dr. Fernando Amado, o meu querido, primeiro e saudoso Mestre. Lá encontrei Manuela de Freitas, Maria do Céu Guerra, Fernanda Lapa, Zita Duarte, Glória de Matos, Norberto Barroca e tantos outros. Lá estava o Palco, a Luz, os Actores, a Música, o Silêncio, a Magia, o Cenário, os Adereços, o "Sonho", e o meu "Sonho" de ser Cenógrafo. Eu não queria ser Actor.
"Deseja-se Mulher" de Almada Negreiros, tinha marcado um encontro com o meu destino e assim me estreei como Actor. Estive ligado à Casa da Comédia até 1965. No mesmo ano fui para o Teatro Experimental de Cascais, como Actor. No T.E.C. fui ficando, fui trabalhando, fui criticado, fui louvado, fui premiado, “e eu não queria ser Actor”.
Fui curioso demais e aceitei a experiência como uma forma de realização pessoal, até chegar às margens da angústia. Continuo insatisfeito. Nunca me consegui libertar do receio de o meu trabalho ser julgado pelos Outros.
Sei que sou frágil e não suporto agressões. Vou flutuando na corrente da vida como um aventureiro receoso, mas determinado.
Às vezes sou derrotado, outras vezes ferido, mas vou aprendendo. As minhas experiências ainda não foram fatais.
Vou prosseguindo com os meus humildes esforços de criação, eles defendem-se em grande medida daquilo que eu ainda não sei e daquilo que eu ainda não fiz.
Aprendi a respirar o pó dos Palcos com Fernando Amado, Carlos Avilez, Artur Ramos, Hélder Costa. Neste momento como Encenador e amigo tenho Mário Viegas. Já vencemos uma batalha. “Enquanto Se Está à Espera de Godot”. Com certeza que ainda vamos vencer outras.
Trabalhar com Manuela de Freitas em “O Ensaio de um Sonho”, é um grande prazer. Será que ela é um Mal Necessário para o meu aperfeiçoamento e auto-correcção? O tempo o dirá. Se eu puder penetrar no seu Universo Interior já me poderei sentir recompensado. Ela é a Actriz.
Talvez um dia eu queira e deseje ser Actor.
As minhas experiências não estão cristalizadas.
A Vida, o que tem de melhor, é o “Sonho” que se altera constantemente.
Esta é a verdadeira Liberdade.

Texto transcrito do programa da peça "O Ensaio de um Sonho", 1994.